Notas sobre alterações trazidas pelo Provimento nº 141/2023
Pautada no olhar da desjudicialização, a união estável segue recebendo atualizações acerca da sua formalização, sendo boa parte dessas novas medidas acompanhada por temas um tanto quanto polêmicos na comunidade.
Como se sabe, a vivência fática da união estável foi alçada ao grau de entidade familiar na Constituição Federal[1] e na Lei Civil[2], visando o reconhecimento de pessoas que convivem na estrutura de família de forma pública, contínua e duradoura.
Até recentemente, os interessados na formalização da vida comum contavam com dois recursos: ou ingressavam com uma ação visando o reconhecimento da união estável com a obtenção de uma sentença judicial, ou lavravam escritura pública junto ao Tabelionato de Notas.
Há menos de um mês o Provimento nº 141/2023, do CNJ, trouxe uma terceira via possível: agora, os interessados podem, por mera declaração ao Registrador Civil das Pessoas Naturais, terem não só o reconhecimento da união estável, como também a sua dissolução.
A normativa mencionada alterou outros pontos do então Provimento nº 37/2014 que trata da união estável, destacando, em especial, a mudança do regime de bens entre os companheiros.
Se no casamento é imprescindível uma decisão judicial que autorize a mudança do regime de bens e partilha entre os cônjuges, a união estável passa a contar com uma facilitação a respeito desses temas.
Com a normativa, os companheiros podem solicitar a mudança de regime pessoalmente ou por meio de procuração pública, diretamente no Registro Civil das Pessoas Naturais, podendo ou não fazer a partilha no mesmo ato. O oficial exigirá a apresentação de documentos e, havendo conformidade, será averbada a desejada alteração de regime de bens.
Importante mencionar que a alteração de regime não prejudicará terceiros de boa-fé, tampouco os credores existentes à época da alteração do regime. Os efeitos do novo regime serão ex nunc, ou seja, contarão a partir da averbação no registro da união estável.
O provimento traz, ainda, a possibilidade de que os companheiros realizem o requerimento em qualquer ofício de registro civil das pessoas naturais, cabendo ao oficial que recepcionou o pedido encaminhar ao ofício competente. A opção de escolha do ofício contraria, polemicamente, as regras de competência da Lei de Registros Públicos[3].
Cenário curioso em relação ao novel procedimento se dá com o fato de que não há nenhuma exigência de escritura de pacto antenupcial para opção de regime diverso da comunhão parcial de bens, o que ocorre, obrigatoriamente, com o casamento[4].
Outra possível discussão decorre do fato de que o Provimento não diz nada a respeito da aplicação do regime da separação obrigatória de bens quando existente causa suspensiva ou em caso de pessoa maior de 70 anos que constitui união estável[5].
Evidentemente que a novidade caminha no sentido da desburocratização, facilitando os caminhos para que os mais diversos tipos de famílias tenham o reconhecimento jurídico de acordo com as realidades em que vivem. Tais regras, contudo, se distanciam – e muito – daquilo que o Legislador propôs para o casamento.
Contudo, não se pode esquecer que a união estável é instituto completamente diverso do matrimônio e assim deve sê-lo. Afinal, se idênticos fossem, não haveria necessidade de serem duas as modalidades diversas de reconhecimento das famílias.
Cabe, neste ponto, relembrar que a consulta a advogado em caráter preventivo sempre será a melhor recomendação. Assim, os desejos dos interessados podem ser tecnicamente amoldados na união estável ou no casamento conforme a peculiaridade que traz cada instituto.
[1] Artigo 226, § 3, da Constituição Federal.
[2] Artigo 1.723, do Código Civil.
[3] Lei 6.015/73.
[4] Artigo 1.640, parágrafo único, do Código Civil.
[5] Artigo 1.641, do Código Civil.
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